27 de maio de 2012

A prisão do mordomo do Papa, o poder do secretário e os vendilhões

27.05.2012 - 13:58 Por António Marujo


O presidente do banco do Vaticano demitido, o mordomo do Papa preso, cartas e documentos sigilosos de Bento XVI e seus colaboradores publicados em livro. A Santa Sé está em ebulição.


O mordomo da casa pontifícia foi ontem formalmente acusado de posse de documentos ilegais, depois de ter sido detido na quarta-feira. A detenção, anunciada apenas na sexta, aconteceu no mesmo dia em que o presidente do Instituto das Obras da Religião (IOR), o banco do Vaticano, foi forçado pelo conselho de supervisão a demitir-se. E na mesma semana em que um livro publicado em Itália divulga cartas e documentos sigilosos enviados ao Papa, ao seu secretário e a responsáveis do Vaticano (ver texto na página ao lado), com o objectivo de "expulsar os vendilhões do templo".

A detenção do mordomo foi confirmada pelo porta-voz do Vaticano, Federico Lombardi: "A pessoa detida por posse ilegal de documentos confidenciais, encontrados no seu domicílio situado no território do Vaticano, é o senhor Paolo Gabriele, que permanece preso", diz o comunicado. Gabriele será dos poucos leigos a viver, com a sua família, no interior do minúsculo Estado, tendo em conta as suas funções. 

Sexta-feira, quando foi anunciada a detenção, o Vaticano não dissera quem era o suspeito, mas quer o jornal Il Foglio quer a agência italiana Ansa coincidiam em identificá-lo desde o início com o mordomo papal, de 46 anos. Definido como homem de confiança da pequena estrutura próxima de Ratzinger, de 85 anos, e uma das raras pessoas em contacto directo com Bento XVI, Gabriele está no lugar desde 2006. 

A detenção surge após as fugas de documentos que começaram no final de Janeiro e se estenderam por quase todo o mês de Fevereiro. Há um mês, o Papa Bento XVI nomeou uma comissão de cardeais para averiguar de onde partiram. Pelos vistos, o primeiro resultado já apareceu e Gabriele, esclareceu o porta-voz, ficou "à disposição da magistratura vaticana para aprofundamentos ulteriores". 

De acordo com o comunicado oficial ontem divulgado, o acusado nomeou dois advogados, com quem já falou, e tem "todas as garantias jurídicas previstas pelo código penal e pelo procedimento em vigor no Estado da Cidade do Vaticano". 

Uma fonte não identificada, citada pela AFP, disse que o Papa ficou "triste e chocado" com este "caso doloroso". "É tudo muito triste" é como outro responsável não identificado, citado pela Reuters, traduz o ambiente que reina no Vaticano. Mas fontes do Vaticano contactadas pelo PÚBLICO não acreditam que Gabriele seja o principal responsável pelas fugas de informação. Provavelmente, ele é apenas o elo mais fraco de um grupo de pessoas que pode mesmo envolver algum cardeal. 

Em causa estará um ambiente de luta pelo poder, numa altura em que se começa a perceber que Bento XVI estará mais fragilizado. Sente-se no Vaticano, como o PÚBLICO noticiava em Abril, um clima de final de pontificado e adensam-se jogos - reais ou imaginários - para a sucessão do actual Papa. O cardeal Tarcisio Bertone, secretário de Estado do Vaticano e número dois da hierarquia, tem sido um alvo privilegiado de críticas. 

Inabilidade e ausência

O facto de Bertone não ser oriundo da carreira diplomática foi bem visto por muitos sectores, quando foi nomeado por Bento XVI - o actual Papa tinha chamado o cardeal para número dois da Congregação para a Doutrina da Fé. Mas, entretanto, a sua alegada falta de habilidade na gestão da máquina eclesiástica e o facto de se ausentar com frequência do Vaticano têm sido objecto de muitas críticas. Tal como a alegada incompetência dos mais directos colaboradores. 

Em paralelo, emerge entretanto também o poder do secretário do Papa, o padre Georg Gänswein. Já com João Paulo II, à medida que a doença progredia e o Papa polaco ia ficando mais frágil, o papel do seu secretário ia sendo cada vez mais acentuado. Afinal, é o secretário quem controla a agenda do Papa. 

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