Problemas ambientais, como o desmatamento e a poluição de grandes rios e mares, ainda nos chocam pela constância e intensidade que acontecem em todo o mundo. Porém, existem também outras questões, ainda mais próximas da realidade da maioria da população global, que precisam de soluções inteligente e rápidas. Esta avaliação é do Índice de Cidades Verdes (GCI, na sigla em inglês) produzido pela Economist Intelligence Unit, com o patrocínio da Siemens.
O documento alerta e classifica a situação das cidades, avaliando questões ambientais urbanas que afetam de maneira imediata os cidadãos. Em 2009, o estudo apresentou dados das cidades europeias e, em novembro de 2010, divulgou o resultado do desempenho ambiental de 17 maiores cidades latino-americanas.
De acordo com a Divisão Populacional das Nações Unidas, a América Latina é a região mais urbanizada no mundo em desenvolvimento, inclusive mais do que diversos países já desenvolvidos. E o percentual da população que vive em cidades latino-americanas deverá crescer ainda mais. Até 2030, deverá chegar a 86%, acompanhando a Europa Ocidental.
O índice identificou as principais práticas de toda a região, fazendo uma descrição detalhada das iniciativas de cada uma delas. Traçou assim um perfil, baseado em oito categorias:
* Energia e CO2,
* Uso do solo e prédios,
* Transporte,
* Resíduos,
* Água,
* Saneamento básico,
* Qualidade do ar
* Governança ambiental
* Uso do solo e prédios,
* Transporte,
* Resíduos,
* Água,
* Saneamento básico,
* Qualidade do ar
* Governança ambiental
O estudo também identificou que, no futuro, os desafios ambientais das áreas urbanas latino-americanas serão ainda maiores. A infraestrutura ficará sob pressão por conta do crescimento da população e da área, especialmente em cidades de médio porte, e também por conta dos efeitos meteorológicos, provocados pelas mudanças climáticas, como enchentes, secas e tempestades. Além disso, o crescimento das cidades fora da estrutura formal de planejamento também continuará.
Para Nicholas You, presidente do Comitê de Coordenação da Campanha Urbana Mundial da ONU-Habitat, diversos obstáculos impedem as cidades de tratar de maneira abrangente os desafios ambientais, como políticas de curto prazo versus as de longo prazo, descentralização e falta de delegação de poderes às autoridades locais, além da sobreposição de jurisdições. Porém, ele acredita que o maior desafio está em conscientizar as populações de que todos são responsáveis por uma fatia do problema.
Para You, as melhores práticas devem ser implementadas na elaboração de políticas ao mais alto nível, deixando de ser iniciativas isoladas. Além disso, ele defende que é preciso levar o planejamento a sério. “Eu não estou dizendo planejamento ‘setorial’, em que cada setor planeja independentemente. Precisamos olhar para as cidades ou para a região metropolitana como um todo”, conclui.
Principais resultados das cidades latino-americanas
A capital do Paraná, Curitiba, foi considerada a metrópole mais verde entre outras 17 da América Latina. Habitada por 1,7 milhão de pessoas, Curitiba foi a única das cidades analisadas que conquistou um resultado “bem acima da média” quanto a implantação de normas ambientais, sendo a única nesse nível de classificação.
No segundo dos cinco níveis, “acima da média”, ficaram as cidades de Bogotá, Brasília, Belo Horizonte, Rio de Janeiro e São Paulo. Resultados na “média” da classificação foram obtidos por Medellín, Cidade do México, Puebla e Monterrey, Porto Alegre, Quito e Santiago do Chile. Já “abaixo da média” ficaram Buenos Aires e Montevidéu, enquanto a mexicana Guadalajara e Lima, capital do Peru, foram classificadas no nível “muito abaixo” da média.
Para os realizadores do GCI, alguns dos resultados do índice podem surpreender. São Paulo, por exemplo, cidade com reputação de congestionamento crônico no tráfego e vasto crescimento urbano desordenado, está classificada como acima da média de maneira global. No entanto, Buenos Aires e Montevidéu, duas cidades agradáveis, têm desempenho geral abaixo da média.
Segundo eles, nem o índice nem essas percepções comuns estão errados. Eles se baseiam em informações diferentes. “A percepção das cidades é baseada em observações subjetivas sobre a qualidade de vida, incluindo fatores como beleza arquitetônica e existência de instituições de lazer ou culturais. A percepção ambiental dos residentes tende a focar em questões altamente problemáticas e visíveis, tais como congestionamento do tráfego, resíduos não coletados, ar ou rios poluídos”, afirma o relatório.
Cidades brasileiras
Pioneira em sustentabilidade de longa data na região, Curitiba é a líder disparada do índice. O berço do sistema de “trânsito rápido de ônibus” (BRT), a primeira cidade com ruas exclusivas para pedestres e a única da lista a se classificar bem acima da média, a cidade também alcançou essa distinção exclusiva em duas categorias individuais: qualidade do ar e resíduos. E está acima da média em cinco outras. A supervisão ambiental da cidade também é consistentemente forte e, além disso, com apenas algumas poucas exceções, está entre as melhores políticas em cada categoria.
Além de Curitiba, outras quatro das seis cidades que terminaram acima da média ou bem acima da média geral no índice são do Brasil. Mas, embora as cidades tenham uma parcela muito alta de energia de hidrelétricas, o que lhes dá a vantagem do desempenho em energia e CO2, em geral, elas não têm outros pontos fortes em particular. O desempenho individual varia bastante dentro das categorias, como acontece com a seção de resíduos, em que Curitiba está bem acima da média e Brasília, bastante abaixo.
No entanto, há um ponto primordial comum entre as cidades brasileiras, inclusive Porto Alegre: políticas ambientais sólidas. Essa questão fica clara quando os indicadores quantitativos são retirados da análise. Cinco das seis cidades brasileiras têm melhor desempenho quando somente os indicadores da política são avaliados. São Paulo, por exemplo, tem um dos planos de ação para mudanças climáticas mais sólidos no índice. Belo Horizonte apresenta bom desempenho com suas políticas de prédios ecológicos e qualidades da água e do ar, enquanto o Rio de Janeiro se destaca por suas políticas de energia limpa. A exceção é Brasília, que cai de acima da média para média geral quando somente os indicadores de política são levados em consideração.
Desempenho ambiental e renda
Outro destaque da pesquisa é a constatação de que não há um relacionamento claro entre o desempenho ambiental geral e a renda de cada cidade no índice, definido como a média do PIB per capita. A renda média para Curitiba, por exemplo, está dentro dos 15% das cifras de renda para três outras cidades com desempenhos largamente distintos: Rio de Janeiro (acima da média), Porto Alegre (média) e Guadalajara (bem abaixo da média). Ao contrário do que foi levantado em estudos similares da EIU em outras regiões, inclusive no Índice de Cidades Verdes da Europa, não houve ligação entre desempenho ambiental e o PIB por pessoa.
Apesar disso, os latino-americanos não suspenderam totalmente as leis da economia, como frisou o professor Roberto Sánchez-Rodríguez, da Universidade da Califórnia e especialista em questões ambientais urbanas. “As cidades mais ricas têm mais recursos. Com renda crescente, há a tendência da população tornar-se mais consciente sobre as questões ambientais e considerá-las importantes”, afirmou. Porém, quando cidadãos mais ricos compram mais carros, por exemplo, o desempenho ambiental da cidade tende a diminuir.
Nas cidades mais pobres, sem infraestrutura básica, não há dúvida também que o dinheiro poderia resolver alguns problemas ambientais, diz o estudo. O índice, no entanto, indica um relacionamento pouco claro entre riqueza e desempenho ambiental. Isso sugere que algum outro aspecto esteja impedindo as cidades mais ricas de usarem somente dinheiro para melhorarem seus resultados ambientais.
Desafios do crescimento
Grande parte da resposta da falta de clareza na questão da renda da América Latina está em como as cidades responderam ao crescimento demográfico rápido e ao resultante crescimento urbano desordenado. A área metropolitana da Cidade do México, por exemplo, passou de cerca de 11 milhões para 18 milhões de pessoas entre 1975 e 2000. De maneira semelhante, entre 1970 e 1990, a população da área metropolitana de São Paulo expandiu quase 90%, de 8,1 milhões para 15,4 milhões.
Em decorrência disso, as autoridades estão tentando adequar-se, diz a pesquisa. Mesmo as cidades mais ricas tendem a fixar-se nos problemas mais imediatos somente quando há uma demanda política forte por uma solução, em vez de se envolverem em ações abrangentes ou planejamento antecipado. “Até que haja algum tipo de crise – pode ser uma crise política devido aos protestos ou porque uma agência não tem como fornecer um determinado serviço ou fica sem dinheiro – as questões ambientais não estão posicionadas no topo da lista de prioridades e muito pouco é feito”, diz o professor Alan Gilbert, da University College de Londres, especialista em urbanização e meio ambiente latino-americanos.
O crescimento urbano desordenado também impôs limites às opções das políticas. De acordo com o estudo, o número de veículos tem efeito negativo não só no transporte, mas também na qualidade do ar e nas emissões de gases estufa, apesar disso, algumas cidades estão tendo dificuldades em criar políticas que limitem o uso do veículo.
Outra consequência do crescimento urbano desordenado é que muitas das cidades maiores cresceram de tal forma que atravessam diversas jurisdições municipais, com governos locais diferentes, algumas vezes nas mãos de partidos políticos opostos. O professor Sánchez-Rodríguez explicou que é difícil juntar esses stakeholders ou mesmo fazer com que concordem em uma visão comum para a cidade. Assim sendo, não é só complicado ir além da solução dos problemas locais imediatos, mas é mais difícil ainda acessar recursos econômicos da cidade toda.
*publicado originalmente no site EcoD.
(EcoD)
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