Caros companheiros/as e entidades
signatárias da nota em defesa da decisão do Conselho Curador da EBC de
substituir a transmissão de missas e cultos em sua programação por um programa
sobre a diversidade religiosa no Brasil,
Antes de
mais nada, agradecemos o apoio e adesão de cada um de vocês àquela manifestação
pública (disponível em: http://www.intervozes.org.br/ noticias/entidades-publicam- nota-sobre-os-programas- religiosos-na-ebc ). Ela foi distribuída na reunião do Conselho Curador da EBC que
aconteceu na terça-feira, dia 27/09, e na audiência pública sobre este tema no
Senado, na quinta-feira, dia 29/09. Na terça, o Conselho da EBC reafirmou sua
posição anterior, de substituição dos programas, e encaminhou um recurso da EBC
à decisão liminar da Justiça que obriga a empresa a manter os programas do ar.
Nosso pleito, portanto, foi atendido pelos conselheiros/as.
Na
quinta-feira, no entanto, a realidade foi bem diferente. Não sabemos se vocês
tiveram a chance de acompanhar a audiência no Senado, então fazemos um breve
relato e encaminhamos o link para a matéria publicada no Observatório do
Direito à Comunicação, que traz os detalhes do que aconteceu:
O que
vimos no Senado - apesar do baixo quórum da audiência (apenas 4 senadores) -
foi uma armadilha para derrubar a decisão do Conselho. Dois senadores da
bancada religiosa (Marcelo Crivella (PRB-RJ) e Anibal Diniz (PT-AC)) e mais o
senador Lindbergh Farias (PT-RJ) não apenas criticaram a decisão do Conselho,
que, para eles, estaria "acabando com qualquer diversidade religiosa na TV
Pública", como criticaram a própria autonomia do Conselho em tomar uma
decisão como esta.
Auxiliados
pela Presidenta da EBC, Tereza Cruvinel (cuja relação com o Conselho anda
bastante desgastada), e por dois deputados evangélicos que foram lá
"convidados" (Anthony Garotinho e Liliam Sá (ambos do PR-RJ), bateram
forte na decisão dos Conselheiros, criticaram sua representatividade e o fato
de divergirem da direção administrativa da EBC, questionaram a consulta pública
que foi feita para ouvir a sociedade sobre a continuidade desses programas,
defenderam o proselitismo religioso na TV pública (dizendo que "o Estado é
laico, mas o povo brasileiro não é") e disseram que aquele "bando de
iluminados" não podia ter mais poder do que os senadores e deputados para
dizer o que o povo brasileiro deve ou não assistir na TV pública. O senador
Lindbergh foi explícito ao dizer que a Presidenta Dilma está contra a decisão
do Conselho.
Ao final,
por sugestão do senador Edson Lobão Filho (PMDB-MA), que presidia a sessão,
decidiram encaminhar uma carta do Senado à EBC e entrar com um decreto
legislativo anulando a decisão do Conselho. O mesmo já tinha sido feito pela
bancada evangélica na Câmara. Ou seja, mesmo que a liminar seja derrubada na
Justiça, tudo indica que as missas e cultos continuarão por força da lei
imposta pelo Congresso. Lindbergh cogita, inclusive, propor uma mudança na Lei
da EBC limitando os poderes do Conselho Curador.
A
situação é gravíssima, pois extrapola o caso específico dos programas
religiosos e configura um verdadeiro ataque ao órgão que é o responsável por
garantir o caráter público e a alguma participação popular nas emissoras da
EBC.
Organizações
do campo da comunicação estão avaliando que conjunto de reações podemos propor
em defesa da autonomia do Conselho Curador e de sua resolução aprovada no
início do ano. Nesta terça (03/10) a questão foi debatida na reunião da Frente
Parlamentar pela Liberdade de Expressão e Direito à Comunicação com
Participação Popular, presidida na Câmara pela deputada Luiza Erundina. Será
feito um pedido de audiência pública na Câmara. Também solicitaremos que senadores
que não participaram da audiência se posicionem sobre o ocorrido na tribuna do
Senado e avaliaremos a possibilidade de audiências com alguns ministros, já que
tudo indica que a ordem veio de cima, pois o governo não quer comprar briga com
a sua base religiosa.
Por fim,
outra iniciativa foi incluir, numa nota da sociedade civil sobre a sucessão na
EBC que já vinha sendo construída (o mandato da Tereza Cruvinel termina dia
29/10), a citação ao ocorrido no Senado e uma defesa da autonomia do Conselho.
Esta carta segue abaixo para que as organizações que tenham interesse em
assiná-la assim o façam. Estamos recebendo as adesões no email
intervozes@intervozes.org.br
Manifestações
individuais das entidades sobre o ocorrido também podem ser interessantes. E o
quanto mais visibilidade dermos à questão, melhor. Caso tenham outras sugestões
de reação também, não deixem de compartilhá-las.
Independentemente
da proposta (bastante complicada) de fatiamento da grade da TV Brasil que foi
apresentada pela direção da EBC aos 48 do segundo tempo (ver link http://www. direitoacomunicacao.org.br/ content.php?option=com_ content&task=view&id=8415
), entendemos que o momento agora não é o de discutir COMO os cultos e missas
devem ser substituídos, mas garantir que a decisão do Conselho Curador, sua
autonomia, suas prerrogativas e legitimidade não sejam colocadas em xeque por
senadores e setores do governo que claramente não estão preocupados em
respeitar a laicidade e o caráter público das emissoras da EBC.
Informaremos
todos e todas dos próximos passos, já aguardando o apoio daquelas organizações
que tiverem interesse em assinar a carta abaixo.
Um
abraço,
Bia Barbosa
Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social
www.intervozes.org.br
(11) 3877-0824/ 8151-0046
Em defesa do caráter público da
EBC
Criada há pouco menos de 4 anos, a EBC – Empresa Brasil de
Comunicação – está concluindo a primeira fase de uma longa caminhada no sentido
da consolidação e fortalecimento da comunicação pública brasileira. Diversos
atores sociais, tanto da sociedade civil como dos poderes públicos,
envolveram-se nos debates iniciais que deram origem à criação da empresa, em
particular durante o I Fórum Nacional de TVs Públicas, o que deu uma grande
legitimidade ao processo de criação da EBC, embora ela continue sofrendo
críticas por parte da mídia comercial privada e de setores da oposição, que
ainda não compreendem a relevância e a necessidade de se garantir a
complementaridade entre os sistemas público, privado e estatal, prevista em
nossa Constituição, para o fortalecimento de nossa democracia.
Infelizmente, o projeto da uma comunicação pública forte no
Brasil, representado em grande medida pela criação da EBC, não se pode
considerar consolidado e ainda corre sérios riscos – evidenciados nas últimas
duas semanas por dois exemplos de atentado contra sua autonomia. Primeiro, a
Justiça Federal conferiu liminar ao pedido da Arquidiocese do Estado a fim de
garantir a permanência dos programas religiosos nas grades de programação das
mídias da EBC. Os programas deveriam ter sido retirados das grades da TV Brasil
e das rádios por decisão do Conselho Curador.
No dia 29, em audiência no Senado Federal para se debater a mesma
decisão do Conselho Curador, parlamentares de vários partidos colocaram em
xeque o próprio Conselho, atentando contra aquela que é uma das principais
conquistas democráticas do processo da criação da EBC. Chegou a ser apresentada
proposta de decreto legislativo anulando a decisão do Conselho Curador.
A despeito do mérito da discussão – e da dúvida sobre a legalidade
das ações da Justiça e do Senado – as duas tentativas representam uma séria
ameaça à autonomia da EBC e a seu caráter público, que tem no Conselho Curador
seu principal fiador. Cabe ao Conselho justamente o papel de zelar pelos
princípios e objetivos da empresa, opinar sobre matérias relacionadas ao
cumprimento desses princípios e objetivos, deliberar sobre a linha editorial de
produção e programação proposta pela Diretoria Executiva da EBC e manifestar-se
sobre sua aplicação prática. No momento em que instituições do Legislativo e do
Judiciário tentam interferir na construção da programação da emissora, seu
caráter público fica evidentemente em risco.
Os próximos quatro anos
Neste momento, a EBC entra numa fase delicada, mas ao mesmo tempo
oportuna, de reafirmar seu caráter público e republicano, ao aproximar-se do
final do mandato da atual Diretora-Presidente. Nestes quase quatro anos de
existência, a atual gestão da EBC promoveu avanços em alguns aspectos
importantes, como investimentos no parque tecnológico de suas emissoras, com
obras e reformas em suas instalações, e a melhoria e diversificação no conteúdo
de suas programações – não só através de novos conteúdos de produção própria,
mas também da produção independente –, além de dar os passos iniciais para a
criação de uma Rede Nacional de TVs Públicas e garantir importantes ferramentas
de governança e controle público, como as Audiências Públicas e o trabalho da
Ouvidoria.
No entanto, há ainda um longo caminho a percorrer para que a EBC e
seus veículos de comunicação (TV Brasil, Agência Brasil, 08 emissoras de rádios
e Radioagência Nacional) se aproximem de fato dos objetivos e metas traçados no
I Fórum Nacional de TVs Públicas, espaço que deu o pontapé inicial no processo
de criação desta nova empresa pública de comunicação em nosso país. Entre eles,
destacamos alguns que consideramos sejam estratégicos para orientar o novo
período de gestão que se aproxima:
1. A universalização
do sinal da TV Brasil (e das emissoras de rádio da EBC), por meio de
infraestrutura única e pública (Operador de Rede), compartilhada com os demais
atores do campo público da comunicação;
2. A construção de
verdadeiras redes nacionais públicas de TV e de Rádio, com a EBC assumindo seu
papel de espinha dorsal do sistema público, mas sempre dialogando com as demais
emissoras públicas de tv e rádio, universitárias, educativas e culturais, de
caráter federal, estadual ou municipal e com suas entidades representativas.;
3. A Consolidação da
Contribuição para o Fomento da Comunicação Pública como fonte contínua e não
contigenciável de um fundo para a comunicação pública, que possa ser acessado
por todos os veículos públicos mas também, e principalmente, pela própria EBC;
4. A transição para as
transmissões digitais de rádio e televisão, bem como o protagonismo no uso de
ferramentas interativas digitais e de linguagem inovadora;
5. O fortalecimento
das ferramentas de governança e de controle público de gestão da EBC, em
particular do Conselho Curador, das Audiências Públicas e da Ouvidoria, no
sentido de garantir uma máxima participação da sociedade na definição das
diretrizes de gestão, programação e investimentos nos veículos da EBC;
6. O desenvolvimento
de metodologia e mecanismos de aferição de audiência e qualidade da programação
condizentes com os objetivos da comunicação pública.
7. Uma gestão interna
que seja cada vez mais democrática, republicana e colegiada, condizente com a
missão institucional de comunicação pública da EBC;
8. A presença cada vez
maior de produção local na programação da TV Brasil nas praças onde exista
geradora própria do canal;
9. A valorização do
corpo de concursados da empresa, através de políticas justas de salários e
condições de trabalho adequadas.
Esses são alguns dos desafios que uma nova gestão da EBC terá que
enfrentar. O atual processo de sucessão na Presidência da EBC pode ser uma
oportunidade valiosa para a consolidação do caráter público e republicano da
empresa. Nomes de possíveis candidatos à sucessão começam a ser ventilados na
mídia, certamente profissionais com currículos qualificados e competência
comprovada em suas áreas. Sabemos que a Lei 11.652/08, em seu artigo 19,
determina que o Diretor-Presidente e o Diretor-Geral da EBC sejam nomeados
diretamente pelo Presidente da República. Mas entendemos como fundamental que
esse processo de indicação seja precedido de publicização do debate e do
envolvimento da sociedade, em torno de ideias e projetos para o futuro da
comunicação pública e da EBC, tomando como referência os objetivos estratégicos
acima elencados. Um amplo debate no âmbito da sociedade civil e do Parlamento
certamente irá contribuir ainda mais para consolidar o projeto da EBC em nossa
sociedade.
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