3 de dezembro de 2012

Seminário aponta caminhos para o combate à discriminação das tradições africanas




Data: 30/11/2012

Articulação do segmento frente ao poder público, tratamento da questão como discriminação racial e novas propostas pedagógicas que atuem na desconstrução de imaginários maniqueístas foram algumas das estratégias apresentadas pelos participantes

Seminário aponta caminhos para o combate à discriminação das tradições africanas

Lideranças religiosas, parlamentares e representantes governamentais reuniram-se para debater estratégias de enfrentamento à violência e ao desrespeito à ancestralidade africana no Brasil. Racismo, intolerância, discriminação, desrespeito às práticas tradicionais são causas e efeitos desse problema social. Para os participantes do Seminário em Defesa da Ancestralidade Africana no Brasil, realizado nesta quinta-feira (29), na Câmara dos Deputados, em Brasília, a solução pode estar na melhor articulação do segmento frente ao poder público, o tratamento da questão como discriminação racial e novas propostas pedagógicas que atuem na desconstrução de imaginários maniqueístas.

De acordo com a secretária de Políticas para as Comunidades Tradicionais da SEPPIR, Silvany Euclênio, o seminário foi motivado pelo aumento da violência contra as tradições africanas no Brasil. "Essa violência é expressa pela agressão a lideranças, depredação de casas, ações contra práticas alimentares tradicionais, entre outros atos. Um encontro como esse é necessário para levar a sociedade a refletir sobre o racismo que motiva essa violação de direitos", explica a secretária. "É extremamente importante que o Estado se posicione quanto a essa questão, pois os negros no Brasil sobreviveram graças a essa cosmovisão preservada pelas culturas tradicionais", ressaltou.

Já Mãe Lúcia de Oyá avalia que o tratamento dado às tradições de matriz africana é discriminatório e tem caráter de satanização. "É um desrespeito aos direitos humanos. Somando a isso o fato de sermos negros, a situação piora", completou. Para o deputado federal Edson Santos, o Estado deve ser cobrado cada vez que deixar de garantir o direito ao culto religioso, já que é seu papel fazê-lo. "O Estado tem ferramentas para coibir ações que desrespeitem as religiões de matriz africana e deve agir quando um segmento está em desigualdade, independente da religião professada pelo gestor público. Se não agir, o gestor está violando a lei e incorrendo em crime de responsabilidade", enfatizou o parlamentar.

Discriminação
Para o sacerdote da Tradição Yorubá, Paulo César Pereira de Oliveira, a questão vai além da intolerância religiosa e configura discriminação racial. "A gênese do racismo surge no momento em que o ser humano africano foi 'coisificado', tendo sua cultura e valores negados. E as práticas tradicionais são expressões dessa africanidade negada desde a época dos missionários", explicou o sacerdote. Segundo ele, esse debate avançará politicamente quando o desrespeito passar a ser tratado como crime de racismo.

Apostar na educação para enfrentar esse quadro é uma possibilidade estratégica sugerida pelo Diretor-Geral da Escola de Filosofia e Teologia Afrocentrada, Jayro Pereira. "Devemos pensar num processo pedagógico que desconstrua o imaginário maniqueísta, que divide o mundo entre o bem e o mal e que fundamenta a intolerância. Uma nova pedagogia que esteja tanto nos terreiros, como nas escolas e que permita uma nova visão de mundo", disse.

O seminário foi realizado pela parceria da Frente Parlamentar em Defesa dos Povos Tradicionais de Terreiro, Frente Parlamentar Mista pela Igualdade Racial e em Defesa dos Quilombos, com a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), dentro da programação do Mês da Consciência Negra. Na abertura do evento, foi exibido o documentário de Carlos Pronzato e Stéfano Barbi, "Até Oxalá vai à guerra", sobre ações violentas executadas pela Prefeitura de Salvador através da demolição do Terreiro Oyá Onipo Neto.


29/11/2012 - 20h51

Debatedores querem políticas para combater ataque a terreiros

Lúcio Bernardo Jr.
Seminário: “Em defesa da ancestralidade africana no Brasil” - Mãe Lúcia de Oya, dep. Amauri Teixeira (Núcleo de Parlamentares Negro do PT), Silvany Euclênio Silva (Secretaria de Políticas para Comunidades Tradicionais/PR), Paulo Cesar de Oliveira (sacerdote da Tradição Yorubá) e dep. Edson Santos (PT-RJ)
Em julho deste ano nove casas de matriz africana foram depredadas em Pernambuco.

Discutir formas de acabar com a discriminação e ataques contra os terreiros tradicionais de matriz africana foi tema de seminário realizado nesta quinta-feira na Câmara.
A presidente da Frente Parlamentar em Defesa dos Povos Tradicionais de Terreiro, deputada Erika Kokay (PT-DF), destacou que eventos como esse são importantes para dar visibilidade aos terreiros e à realidade daqueles que seguem religiões africanas.
Em julho deste ano nove casas de matriz africana foram depredadas em Pernambuco. Segundo Mãe Lúcia de Oxum, yalorixá do Centro de Cultura Afro-Brasileiro Ilê Axé Omidewá, em João Pessoa, na Paraíba, os ataques são constantes e ocorrem em todo o País.
Assédio religioso
Ela classificou como assédio religioso os ataques sofridos diariamente pelos terreiros. Lúcia de Oxum pede mais rigor da Justiça para punir os envolvidos. "O máximo que eles entendem é como crime de injúria; e o crime de injúria não dá em nada."
Erika Kokay destacou que a frente vai realizar reuniões com os agentes de direito para que eles possam conhecer a realidade dos terreiros e proteger seus frequentadores. "É preciso que nós trabalhemos no processo de desconstrução de uma intolerância que invade os poderes públicos e que invade o próprio Estado e que faz com que as comunidades de terreiro não possam viver com a dignidade que o País deve a essas comunidades."
A secretária de políticas para comunidades tradicionais, da Secretaria de Promoção de Políticas para Igualdade Racial da Presidência da República, Silvanir Silva, afirmou que o enfrentamento do racismo passa necessariamente pela valorização das tradições africanas e das casas que representam a cultura africana no Brasil. "Nós também estamos muito preocupados em como promover um processo de valorização dessa cultura, dessa tradição, de maneira a desfazer estereótipos que motivam tamanha violência."
Mapeamento
Silvanir informou que no próximo ano o governo vai fazer um levantamento socioeconômico para mapear quantas são e onde estão as casas de tradição de matriz africana em todo o País. A partir daí, o Plano Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos Tradicionais de Matrizes Africanas começará a ser implementado.

Reportagem - Karla Alessandra
Edição - Regina Céli Assumpção

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